DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

12/04/2012

Princípio




No meio de frases destruídas,
de cortes de sentido e de falsas
imagens do mundo organizadas
por agressão ou por delírio
como vou saber se a diferença
não há-de ser um pacto novo,
um regresso às histórias e às
árduas gramáticas da preservação.
Depois dos efeitos de recusa
se dissermos não, a que diremos
não?
Que cânones são hoje dominantes
contra que tem de refazer-se
a triunfante inovação?
Voltar junto dos outros, voltar
ao coração, voltar à ordem
das mágoas por uma linguagem
limpa, um equilíbrio do que se diz
ao que se sente, um ímpeto
ao ritmo da língua e dizer
a catástrofe pela articulada
afirmação das palavras comuns,
o abismo pela sujeição às formas
directas do murmúrio, o terror
pela construída sintaxe sem compêndios.
Voltar ao real, a esse desencanto
que deixou de cantar, vê-lo
na figura sem espelho, na perspectiva
quase de ninguém, de um corpo
pronto a dizer até às manchas
a exacta superfície por que vai
onde se perde. Em perigo.

Joaquim Magalhães, em Os Dias, Pequenos Charcos

3 comentários:

  1. Tou de volta, Ci. E de volta ao real, com e sem encanto, com e sem espelho, e luminoso independente da perspectiva, das maculas e das superfícies.
    Saudades de você, guria :)
    beijosss

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  2. Ci, boa tarde!
    Mais um poema a espelhar uma boa escolha poética para nós.
    Tchau e uma ótima semana!

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  3. Voltar à Sintaxe Originária: a Interjeição antes do Verbo, o Verbo antes do Nome.







    Um beijo, Cirandeira!

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