DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

17/11/2017

Economia

 
 
Nos nossos trens de subúrbios passam-se às vezes coisas bem divertidas. Já não se fala das altercações entre os auxiliares e os passageiros por causa de passagens, passes etc. Os regulamentos são tão exigentes, e o público está tão disposto a lesar o Estado, que esses atritos hão de se dar sempre.
Há também as conversas que são interessantes.
Um companheiro de banco volta-se para nós e diz, depois de ler o seu jornal:
- Veja só, o senhor, como vai este país. Ladroeira sobre ladroeira. Não há governo que conserte isso. Eu endireitava isso em oito dias...Não querem emissão de papel-moeda...
Que querem? Ouro. Nuca vi disto aqui desde que me conheço...E são financeiros?
Um outro, logo que se senta, pergunta:
- O senhor é empregado público?
Afirmamos que somos e dizemos de que repartição. Ele continua:
- É uma boa repartição. A minha não presta para nada. Estou lá há vinte anos e ainda não tive uma promoção. Se estivesse na sua, talvez já fosse chefe de seção. Demais, na
minha, há uns tantos que não fazem nada, mas não deixam nós sermos chefes. No comércio, eu já estava rico, mas quis
casar-me cedo, foi essa desgraça...
Como essas muitas outras que não contamos para não enfadar. Entretanto, vamos narrar esta pequena anedota bem cômica.
Um dia destes, viajando num carro de segunda classe, havia um passageiro que trazia cuidadosamente um embrulho. Chegou a hora da cobrança das passagens, e ele colocou com cuidado no colo, preso às pernas, o volume. Pôs-se a procurar pelas algibeiras o bilhete de passagem.
Chega o condutor, ele faz um movimento qualquer, o embrulho move-se, abre-se, salta uma galinha a cantar
- Cocorococó! Cocorococó!
O passageiro corre atrás do bicho e o condutor atrás:
- Pague a multa! Pague a multa!
A galinha corre pelo carro todo e o passageiro atrás.
O condutor continua correndo atrás do passageiro:
- Pague a multa!
O passageiro, atrás sempre do bicho, contesta:
- Espere! Espere! Deixe-me apanhar a minha galinha primeiro.
Esta voou pela janela, e o homem teve que entrar com alguns níqueis para os cofres do Estado.

Lima Barreto em Sátiras e outras subversões

Um comentário:

  1. Leo con una sonrisa estas divertidas e irónicas crónicas de Lima Barreto, y lo que al final queda claro es que pase lo que pase, el Estado nunca pierde.

    El señor de la última anécdota se quedó sin su gallina, pero el Estado igual le cobró la multa.

    Sigo por aquí un rato. Un placer pasar por aquí.

    Un abrazo,

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