06/04/2025

Dois poemas de Paulo Henriques Britto

 




Dentro da noite por fim construída

há tempo para tudo, e muito espaço.

Longas janelas. 

Cortinas corridas.

Nos armários vazios,

grandes chumaços de algodão

a preencher cada centímetro e gaveta.

Na parede, um termômetro no qual

ninguêm dá corda há muito tempo.

Nas prateleiras, livros entulhados

de palavras que escorrem devagar,

formando umas poças ralas no chão.

É uma espécie de véspera. Calados,

os cômodos esperam o raiar de

alguma coisa como um dia. Ou não.

( de Nenhum mistério, 2018)


Toda vida é provisória,

todo poema é fragmento.

Cada dia, cada hora, cada verso

é só um momento de alguma totalidade

que você sequer concebe.

Viva e escreva e não se abale.

Você não é o que você escreve.

( de Fim de verão, 2022)


Paulo Henriques Britto, nasceu no Rio de Janeiro em 1951. É poeta, contista e tradutor.

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