DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

29/09/2013

O " Brasil Natural" de Valdemir Cunha

 



 

 
 
 

 

 
 

 
 

 

 

 
 
 



 
 


23/09/2013

Antonio Ramos Rosa: "Estou vivo e escrevo sol..."


 
Estou vivo e escrevo sol
 
 
Eu escrevo versos ao meio-dia
e a morte ao sol é uma cabeleira
que passa em fios frescos sobre a minha cara de vivo
Estou vivo e escrevo sol
 
Se as minhas lágrimas e os meus dentes cantam
no vazio fresco
é porque aboli todas as mentiras
e não sou mais que este momento puro
a coincidência perfeita
no ato de escrever e sol
 
A vertigem única da verdade em riste
a nulidade de todas as próximas paragens
navego para o cimo
tombo na claridade simples
e os objetos atiram suas faces
e na minha língua o sol trepida
 
Melhor que beber vinho é mais claro
ser no olhar o próprio olhar
a maravilha é este espaço aberto
a rua
um grito
a grande toalha do silêncio verde




*****

As palavras juntam-se e juntando-se separam-se
Será a sua fluência o movimento da liberdade?
Elas atravessam o vazio do tempo e são formas do tempo
que flui no exterior e no íntimo de nós

Nomear é a elevação de um nível em lúcida perspectiva
e libertar a possibilidade de ser
o que em si não é e só será em forma decisiva
no movimento em que estremece e que está sempre oculto

Há palavras que surgem oscilando sonâmbulas
há outras que entremostram a nudez do linho em seu pudor
há algumas que são apenas formas de água ou desenhos do vento

Mas todas elas obedecem a uma única pulsação
que dir-se-ia o frêmito das veias sobre a página

Mas se não forem mais do que lâmpadas de areia com alguma espuma
nelas ainda cintilará um pálido fulgor solar
que ilumine a agonia do seu vacilante nascimento


Antônio Ramos Rosa, nasceu em Faro, Portugal, e faleceu nesta segunda-feira, à tarde, aos 88 anos de idade.


21/09/2013

Sol de primavera



 
 
 
Quando entrar setembro e a boa nova
andar nos campos
quero ver brotar o perdão
onde a gente plantou juntos
outra vez
Já sonhamos juntos semeando
as canções no vento
Quero ver crescer nossa voz
no que falta sonhar
Já choramos muito, muitos se perderam
no caminho
Mesmo assim não custa inventar
uma nova canção que venha
nos trazer
Sol de primavera abre
as janelas do meu peito
A lição sabemos de cor
só nos resta aprender
 
 
Beto Guedes

18/09/2013

Escritura

Escrevo menos do que vejo
e vejo muito menos do que existe.
No entanto seria suficiente
tomar um feixe de palavras
e sair a errar
pela página em branco
sem perder de vista
que o mundo é vasto
mas não é o único.
 
 
 
Indícios
 
 
Existe um ponto aberto
na porta dos olhos.
Não é um caminho
nem sinal de nada importante
para ninguém.
Apenas ocorre que tem
um ponto aberto
na porta dos olhos.
 
 
 
Teresa Calderón, La Serena, Chile (1955-   )

15/09/2013

Tramas

 
Una palabra
trae
la outra versión
de si:
su no
su necessário
su inaudible.
 
 
Silencio
 
La oscuridad
el hueco
el mundo aparte:
todas la sílabas
que se omitieron
vuelven.
 
 
Rodolfo Enrique Fogwill, Buenos Aires (1941-2010)


12/09/2013

O macaco que queria ser escritor satírico





Na Selva vivia uma vez um Macaco que quis ser escritor satírico. Estudou muito, mas logo se deu conta de que para ser escritor satírico lhe faltava conhecer as pessoas e se aplicou em visitar todo mundo e ir a todos os coquetéis e observá-las com o rabo do olho enquanto estavam distraídas com o copo na mão.
Como era verdadeiramente muito gracioso e as suas piruetas ágeis divertiam os outros animais, era bem recebido em toda parte e aperfeiçoou a arte de ser ainda mais bem recebido. Não havia quem não se encantasse com sua conversa, e quando chegava era recebido com alegria tanto pelas Macacas como pelos esposos das Macacas e pelos outros habitantes da Selva, diante dos quais, por mais contrários que fossem a ele em política internacional, nacional ou municipal, se mostrava invariavelmente compreensivo; sempre, claro, com o intuito de investigar a fundo a natureza humana e poder retratá-la em suas sátiras.
E assim chegou o momento em que entre os animais ele era o mais profundo conhecedor da natureza humana, da qual não lhe escapava nada. Então, um dia disse:  vou escrever contra os ladrões, e se fixou na Gralha;  começou a escrever com entusiasmo,  gozava e ria e se encarapitava de prazer nas árvores pelas coisas que lhe ocorriam a respeito da Gralha; porém de repente refletiu que entre os animais da sociedade que o recebiam havia muitas Gralhas e especialmente uma, e que iam se ver retratadas na sua sátira, por mais delicada que a escrevesse, e desistiu de fazê-lo
. Depois quis escrever sobre os oportunistas, e pôs o olho na Serpente, a qual por diferentes meios — auxiliares na verdade de sua arte adulatória — conseguia sempre conservar, ou substituir, por melhores, os cargos que ocupava; mas várias Serpentes amigas suas, e especialmente uma, se sentiriam aludidas, e desistiu de fazê-lo.
Depois resolveu satirizar os trabalhadores compulsivos e se deteve na Abelha, que trabalhava estupidamente sem saber para que nem para quem; porém com medo de que suas amigas dessa espécie, e especialmente uma, se ofendessem, terminou comparando-a favoravelmente com a Cigarra, que egoísta não fazia mais do que cantar bancando a poeta, e desistiu de fazê-lo.
Finalmente elaborou uma lista completa das debilidades e defeitos humanos e não encontrou contra quem dirigir suas baterias, pois tudo estava nos amigos que sentavam à sua mesa e nele próprio. Nesse momento renunciou a ser escritor satírico e começou a se inclinar pela Mística e pelo Amor e coisas assim; porém a partir daí, e já se sabe como são as pessoas, todos disseram que ele tinha ficado maluco e já não o recebiam tão bem nem com tanto prazer.


Augusto Monterroso nasceu em 1921, em Tegucigalpa, capital de Honduras.  Em 1944, mudou-se para o México e, depois de muito observar a fauna daquele país e de outros, se convenceu de que "os animais se parecem tanto com o homem que às vezes é impossível distingui-los deste". Assim surgiu "A ovelha negra e outras fábulas", lançado pela Editora Record - Rio de Janeiro, 1983, com tradução de Millôr Fernandes e ilustrações de Jaguar, de onde extraímos o texto acima (pág. 11).
Dele disse o escritor russo que se criou nos Estados Unidos, Isaac Asimov: "Os pequenos textos de A ovelha negra e outras fábulas, de Augusto Monterroso, aparentemente inofensivos, mordem os que deles se aproximam sem a devida cautela e deixam cicatrizes. Não por outro motivo são eficazes. Depois de ler "O macaco que quis ser escritor satírico", jamais voltei a ser o mesmo."
Foi agraciado, em 2000, com o Prêmio Príncipe de Astúrias de Letras. Um dos escritores latinos mais notáveis, Monterroso tem predileção por contos e ensaios. "O dinossauro", uma de suas obras mais célebres, é considerado o menor conto da literatura mundial: "Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá".
Augusto Monterroso faleceu em fevereiro/2003.

Extraído de  http://www.releituras.com

08/09/2013

A máquina de fazer radadistas


Kurt Schwitters


A máquina de fazer radadistas foi feita para você. Ela compõe-se de uma excepcional combinação de engrenagens, eixos e cilindros, com cadáveres, ácido nítrico e MERZ e foi construída de tal forma, que você entra nela em pleno gozo de suas faculdades mentais e sai completamente sem juízo. Tal efeito traz grandes vantagens para você. Invista o seu dinheiro em uma cura-radadista e você jamais se arrependerá; aliás, a sua capacidade de se arrepender será completamente inexistente após a cura. Não importa se você é rico ou pobre, a máquina de fazer radadistas o libertará — inclusive — da necessidade do dinheiro em si. Se você é capitalista, passará primeiro por um funil, depois por vários cilindros, até mergulhar num banho de ácido. Depois, você entrará em contato físico com alguns defuntos. Vinagre gotejará cubismo dadá. Então você verá o grande Radadá. (Não o presidente do globo terrestre, como muitos pensam). Radadá irradia astúcia e é revestido de cerca de 100.000 agulhas pontiagudas. Depois de ser chacoalhado para lá e para cá, alguém lerá para você meus novos poemas, até você cair inconsciente. Aí você será socado e radadado, para depois, de repente, ser expelido para fora da máquina, transformado em um antiburguês com um novo penteado. Antes da cura, você tinha pavor até do buraco de uma agulha, depois da cura, nada mais o apavora. Você é um Radadista e reza diante da máquina com todo o fervor. — Amém.


Kurt Schwitters, Alemanha (1887-1948)

06/09/2013

O relâmpago e o vagalume


 
A diferença entre a palavra certa e a palavra errada é a mesma diferença entre o relâmpago e o vagalume. Contudo, todas as palavras brilham. Os vagalumes têm sua beleza no meio da noite. O relâmpago é mais assustador. É perigoso. A palavra certa pode ser fatal!
 
 
Mark Twain, Flórida(EUA) - 1835-1910


05/09/2013

Clube Militar: "Equívoco, uma ova!

Numa mudança de posição drástica, o jornal O Globo acaba de denunciar seu apoio histórico à Revolução de 1964. Alega, como justificativa para renegar sua posição de décadas, que se tratou de um “equívoco redacional”. Dos grandes jornais existentes à época, o único sobrevivente carioca como mídia diária impressa é O Globo. Depositário de artigos que relatam a história da cidade, do país e do mundo por mais de oitenta anos, acaba de lançar um portal na Internet com todas as edições digitalizadas, o que facilita sobremaneira a pesquisa de sua visão da história.

Pouca gente tinha paciência e tempo para buscar nas coleções das bibliotecas, muitas vezes incompletas, os artigos do passado. Agora, porém, com a facilidade de poder pesquisar em casa ou no trabalho, por meio do portal eletrônico, muitos puderam ler o que foi publicado na década de 60 pelo jornalão, e por certo ficaram surpresos pelo apoio irrestrito e entusiasta que o mesmo prestou à derrubada do governo Goulart e aos governos dos militares. Nisso, aliás, era acompanhado pela grande maioria da população e dos órgãos de imprensa.

Pressionado pelo poder político e econômico do governo, sob a constante ameaça do “controle social da mídia” – no jargão politicamente correto que encobre as diversas tentativas petistas de censurar a imprensa – o periódico sucumbiu e renega, hoje, o que defendeu ardorosamente ontem.

Alega, assim, que sua posição naqueles dias difíceis foi resultado de um equívoco da redação, talvez desorientada pela rapidez dos acontecimentos e pela variedade de versões que corriam sobre a situação do país. Dupla mentira: em primeiro lugar, o apoio ao Movimento de 64 ocorreu antes, durante e por muito tempo depois da deposição de Jango; em segundo lugar, não se trata de posição equivocada “da redação”, mas de posicionamento político firmemente defendido por seu proprietário, diretor e redator chefe, Roberto Marinho, como comprovam as edições da época; não foi, também, como fica insinuado, uma posição passageira revista depois de curto período de engano, pois dez anos depois da revolução, na edição de 31 de março de 1974, em editorial de primeira página, o jornal publica derramados elogios ao Movimento; e em 7 de abril de 1984, vinte anos passados, Roberto Marinho publicou editorial assinado, na primeira página, intitulado “Julgamento da Revolução”, cuja leitura não deixa dúvida sobre a adesão e firme participação do jornal nos acontecimentos de 1964 e nas décadas seguintes.

Declarar agora que se tratou de um “equívoco da redação” é mentira deslavada.
Equívoco, uma ova! Trata-se de revisionismo, adesismo e covardia do último grande jornal carioca

Nossos pêsames aos leitores.

General de Divisão Clóvis Purper Bandeira, assessor da Presidência do Clube Militar

extraído de www.viomindo.com.br  .