DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

08/04/2015

O relâmpago




O trabalho humano! é a explosão que ilumina o meu abismo de vez em quando. "Nada é vaidade; vamos à ciência e para a frente"!, grita o Eclesiaste moderno, ou seja, Todo o mundo. E no entanto os cadáveres dos maldosos e dos preguiçosos caem sobre o coração dos outros... Ah! rápido, rápido um pouco; lá, além da noite, estas recompensas futuras, eternas...escaparemos?
        - Que posso eu? Conheço o trabalho e a ciência é muito lenta. Que a reza galope e que a luz troveje...vejo bem. É muito simples, e está calor demais; passarão sem mim. Tenho meu dever, tirarei orgulho como muitos, deixando-o de lado.
        A minha vida está gasta. Vamos1 vamos fingir, preguiçar, ó piedade1 E existiremos brincando, sonhando amores monstros e universos fantásticos, queixando-nos e brigando com as aparências do mundo, saltimbanco, mendigo, artista, bandido - padre! Na minha cama de hospital, o cheiro do incenso me voltou tão forte; guardião dos perfumes sagrados, confessor, mártir...
        Reconheço aqui a minha nojenta educação da infância. Depois o quê?...Ir meus vinte anos, se os outros vão vinte anos...
        Não, não! agora me revolto contra a morte! O trabalho parece leve demais ao meu orgulho: minha traição ao mundo seria um suplício muito curto. No último momento, atacarei á direita, à esquerda...
         Então, - oh! querida pobre alma, a eternidade não estaria perdida para nós!

 
Arthur Rimbaud  (1854-1891)

04/04/2015

Quem pergunta quer saber (?)


 
 
Por quê me olhas sempre,
assim, de soslaio? teus olhos duas
esmeraldas num copo d'água não têm
a visão oceânica dos mares;
por quê me falas desse modo
sempre tão reticente, quase mudo
e duvidoso? Tua boca carnuda e voraz
é lâmina afiada e traiçoeira e ceifa
as palavras pela raiz. Pensamentos
enclausurados e solitários desencadeiam
motins cerebrais, dendritos esfacelam-se
provocam curtos circuitos sinápticos!
 
Nesse universo intergaláctico onde os bilhões
de estrelas são gavetas de poeira;
 onde o sol é apenas uma estrela
 comum; tua omissão, teu andar sorrateiro
transformou-te num minúsculo ponto
quase invisível,
poeira que se dissipa na imensidão
do deserto...

01/04/2015

A poesia não...

Abdias do Nascimento


A poesia não se propõe criar uma realidade poética a partir da realidade comum, mas criar uma realidade independente que se baste a si mesma e seja, ela própria uma finalidade.
 
 
HERBERTO HELDER, 1930-2915