Ai de ti, Copacabana, porque eu já fiz o sinal bem claro de que é chegada a véspera de teu dia, e tu não viste; porém minha voz te abalará até as entranhas.
Ai de ti, Copacabana, porque te chamaram a Princesa
do Mar, e cingiram tua fronte com uma coroa de mentiras; e deste risadas ébrias e vãs no seio da noite.
Já movi o mar de uma parte e de outra parte, e suas ondas tomaram o Leme e o Arpoador, e tu não viste este sinal; estás perdida e cega no meio de tuas iniquidades e de tua malícia.
Sem Leme, quem te governará? Foste iníqua perante
o oceano, e o oceano mandará sobre ti a multidão de
suas ondas.
Grandes são os edifícios de cimento, e eles se postam diante do mar; mas eles se abaterão.
[...]
Ai daqueles que passam em seus cadilaques buzinando alto, pois não terão tanta pressa quando virem pela frente a hora da provação.
Tuas donzelas se estendem na areia e passam no corpo óleos odoríferos para tostar a tez e teus mancebos fazem das lambretas instrumentos de concupiscência.
Uivai, mancebos, e clamai, mocinhas, e rebolai-vos na cinza, porque já se cumpriram vossos dias, e eu vos quebrantarei.
Ai de ti, Copacabana, porque os badejos e as garoupas estarão nos poços de teus elevadores, os meninos do morro, quando for chegado o tempo das tainhas, jogarão tarrafas no Canal do Cantagalo; lançarão suas linhas dos altos do Babilônia.
Antes de te perder eu agravarei a tua demência - ai de ti, Copacabana! Os gentios de teus morros descerão uivando sobre ti, e os canhões de teu próprio Forte se voltarão contra o teu corpo, e troarão; mas a água salgada levará milênios para lavar os teus pecados de um só verão.
[...]
A rapina de teus mercadores e a libação de teus perdidos; e a ostentação da hetaira do Posto 5, em cujos diamantes se coagularam as lágrimas de mil meninas miseráveis tudo passará.
[...]
Pinta-te qual mulher pública e coloca todas as tuas jóias, e aviva o verniz de tuas unhas e canta a tua última canção pecaminosa, pois em verdade é tarde para a prece; e que estremeça o teu corpo fino e cheio de máculas, desde o Edifício Olinda até a sede dos Marimbás porque eis que sobre ele vai a minha fúria, e o destruirá. Canta a tua última canção, Copacabana!
Crônica escrita em 1958 por Rubem Braga - Cachoeiro de Itapemirim(ES), 1913-1990.