DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

28/06/2014

O retrato de Dorian Gray, uma leitura psicanalítica




Oscar Wilde criou o duplo de Dorian Gray e seu retrato - um recurso aparentemente vazio desprovido de sentido no mundo da literatura fantástica - mas que na realidade mostra-se bem mais complexo. Esta obra possui um criador e sua criação monstruosa, sujeitando-os a uma nova fragmentação. O pintor Basil Hallward cria o que no fim de tudo resultará numa aterradora obra de arte – digna das regiões do Tártaro -, na qual revela muito de sua própria vida, e, que por isso, deve permanecer em segredo. Mas a vida por ele pintada torna-se independente dele; o retrato afigura-se como original e duplo do próprio Dorian. Ele simplesmente pensa num desejo impossível: ficar sempre jovem enquanto o seu retrato envelhece. Dorian é um narcisista por assim dizer introvertido - e não conseguindo realizar suas pulsões, desloca-as para o objeto na tentativa de obter a satisfação narcísica. O criador diante da criatura: “Você se tornou para mim a encarnação visível daquele ideal invisível cuja memória nos obceca a nós artistas como um sonho perfeito”. Esta obra de Oscar Wilde – é bom que se diga – transformou-se na época (1891) numa espécie de evangelho do decadentismo e do esteticismo. A morte de Dorian é simultânea com o golpe que ele desfere contra o retrato. Criados entram na sala olhando o magnífico retrato na parede do amo. Ele o retrato estava ali como eles os tinham conhecido: na esplendência de sua mocidade e beleza. Mas no chão jazia o cadáver de um homem em traje-rigor – com uma faca cravada no peito: lívido enrugado repugnante. Mas pelos anéis conseguiram identificá-lo. Era claro o próprio Dorian Gray - um outro de si mesmo, desconhecido como tal e reconhecido pela sensação de estranhamento que é capaz de causar. O duplo é um Outro, que olha o sujeito sem lhe dizer nada, apenas faz com que ele se interrogue fazendo-se a seguinte questão: “que queres tu de mim?” - ou “Che voi”?

Najla Assy, psicanalista, doutora em Psicologia pela Universidade Paris VII - Sorbonne, França

Um comentário:

  1. Será que foi?[risos]Eu comentei sem estar logada. Enfim, essa foi mais uma excelente postagem dessa enigmática obra do genial Oscar Wilde. Beijos, Ci!

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