O poema depois de pronto
ainda luta com o poeta
e vai crescendo na gaveta,
onde não cabe uma esperança.
Cresce em seguida no meu bolso,
muito menor para contê-lo.
O poema, depois de pronto,
quer-se mostrar, como as crianças.
Fica assustado no casaco
e parece que tem meus olhos.
(Eu lhe acendi o último fósforo
às duas horas da manhã.)
Dentro de mim se move alguém
sempre a julgar-se muito alto,
mas fica na ponta dos pés
quando procura ser notado.
Salva-me na Terra este grande
pudor de mostrar o poema,
como se fosse uma das partes
mais verdadeiras do meu corpo.
*****
Casa vazia
Poema nenhum, nunca mais será um acontecimento:
escrevemos cada vez mais
para um mundo cada vez menos,
para esse público dos ermos
composto apenas de nós mesmos,
uns jõoes batistas a pregar
para as dobras de suas túnicas
seu deserto particular,
ou cães latindo, noite e dia,
dentro de uma casa vazia.
Alberto da Cunha Melo, jornalista, sociólogo e poeta. Jaboatão dos Guararapes(PE)1942-2007.
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