Cresce comigo o boi com que me vão trocar
Amarraram-me já às costas, a tábua Eylekessa
Filha de Tembo
organizo o milho
Trago nas pernas as pulseiras pesadas
dos dias que passaram...
Sou do clã do boi -
Dos meus ancestrais ficou-me a paciência
O sono profundo de deserto.
A falta de limite...
Da mistura do boi e da árvore
a efervescência
o desejo
a intranquilidade
a proximidade
do mar
Filha de Huco
com a sua primeira esposa
uma vaca sagrada,
concedeu-me
o favor das suas tetas úberes.
"Rapariga", de Ana Paula Ribeiro Tavares, poeta angolana nascida em Lubango, província da Huila, em 1952. É formada em História, com mestrado em Literaturas Africanas. Reside em Lisboa, onde faz um doutorado e dá aulas na Universidade Católica. Já publicou "Ritos de Passagem", "O Lago da Lua" e "Manual dos Amantes Desesperados".
Não conhecia a poeta, achei o poema estranho e belo. Em geral nós, brasileiros, conhecemos mal a poesia africana, inclusive a de língua portuguesa. É excelente quando a vemos divulgada, como neste post, Cirandeira. Obrigada.
ResponderExcluirConheco esta poeta e continuamos esperando sempre mais e mais da sua pena.
ResponderExcluirObrigado.
Kandandu
Cirandeira,
ResponderExcluirQuanto ao pedido que me fez,lá no meu blog, penso que, sendo Ana Paula Tavares natural da província da Huíla, o termo “tábua Eylekessa” seja da tradição do povo Nhaneka-Humbi, que pode incluir, entre outras tribos, os Muíla. Angola tem muitos povos, muitas línguas e expressões culturais diferentes. Embora a maioria seja Bantu, isso não significa uma linearidade pois Bantu é só um termo para aglutinar uma família de línguas ( Bantu é o plural de homens, cujo singular é ntu).
Eu não conheço o significado concreto de “tábua Eylekessa” mas pela leitura do poema e pelos conhecimentos da tradição do casamento posso dizer que se trata de um símbolo que diz a toda a gente que aquela jovem rapariga está cumprindo um ritual relacionado com o seu casamento. Os seus pais concordaram e já concentiram no casamento, ela está comprometida. Agora só falta os pais, ou melhor o seu pai, receber o dote de casamento que é conhecido, em geral, por alembamento. Nas sociedades Bantu, o dote é pago ao pai da noiva, pelos pais do noivo, pode consistir de várias coisas materiais mas nas culturas mais tradicionais e onde predomina a pastorícia, o noivo pagará o alembamento com bois, cabras ou outro qualquer animal que tenha sido acordado. O número de animais depende da importancia social dos pais da noiva e é acordado antes do pagamento do alembamento.Por isso é muito vantajoso ter filhas.
Espero ter ajudado em alguma coisa. Infelizmente nada de mais concreto sei sobre este termo.
Kandandu
"Obrigadíssima", Namibiano. Tuas informações me foram muito úteis. Busquei informações, mas encontrei apenas algumas inferências, nada como a explicação que destes.Imaginava alguma coisa nesse sentido, mas não tinha certeza.Creio que é isso mesmo.Acho muito importante poder fazer esse intercâmbio de informações sobre a África com alguém que é de lá.
ResponderExcluirUm grande abraço, kandandu
A figura do boi é mesmo emblemática, carregada de símbolos e signos, mas foi usada neste poema de uma forma totalmente diferente. Gostei imensamente. Também não conhecia a poeta, Cirandeira. "Trago nas pernas as pulseiras pesadas dos dias que passaram... " É uma imagem forte e bela demais. Beijos!
ResponderExcluirPoesia em língua que todos nós bem percebemos!
ResponderExcluirBendito idioma!
Saudações
Ouvíssemos mais a África e seríamos menos geométricamente estúpidos.
ResponderExcluirOnde está a África em nós?
Oculta sob símbolos que se não os tratamos...
Bendita a rapariga da poeta Ana Paula.
1 abraço.
OLá!
ResponderExcluirNão conhecia a literatura angolana.
Que lindeza esta poetisa.
Ao ler senti saudades dos textos do Africano Mia Couto.
Bjs!