DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

04/04/2016

Da arte de ser poeta




[...] Atingimos o ponto máximo do egoísmo, o estado atômico do ser. E seremos despedaçados. Preparamo-nos agora para a morte do pequeno ego a fim de que possa surgir o ego verdadeiro. Inconscientemente e sem querer unificamos o mundo, mas também o nulificamos. Se for verdade, como disse Lautréamont, que "a poesia deve ser feita por todos", então temos que achar uma nova linguagem em que um coração fale com outro sem intermediários. (...) Ser poeta era antigamente a vocação mais sublime; hoje é a mais fútil. E isso não porque o mundo seja imune às súplicas do poeta, mas porque ele mesmo não acredita mais no caráter divino de sua missão. Já vem cantando fora de tom há mais de um século; por fim não conseguimos mais sintonizar. [...] O culto da arte não preenche sua finalidade quando só existe para meia dúzia de homens e mulheres privilegiados. Então não é mais arte, mas a linguagem cifrada de uma sociedade secreta para a propagação de uma individualidade descabida. A arte é algo que incita as paixões humanas, que dá visão, lucidez, coragem e fé. Que artista da palavra, nestes últimos anos, incitou o mundo como Hitler? (...)
Que armas tem o poeta, em comparação? Ou que sonhos? Aonde foi parar a
sua decantada imaginação? A realidade está aí, diante de nossos próprios olhos, completamente nua, mas onde está o cântico para anuncia-la? Existe algum poeta visível, de quinta magnitude ao menos? Não vejo nenhum. Não chamo de poeta quem apenas faz versos, com ou sem rima. Para mim, poeta é aquele homem capaz de alterar profundamente o mundo. Se houver um poeta desses vivendo entre nós, que se proclame. Que levante a voz!
 
 
Henry Miller (1891-1980), em A hora dos assassinos

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