DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

28/10/2009

CONSTELAÇÕES...

"Dress with flowers" - Ai Weiwei


Usamos todos a ilusão

de fabricar a vida:

histórias, constelações

de sons e gestos

Usamos todos a suprema glória

do amor: por generosidade

ou fantasia, ou nada,

que de nada se fazem universos

Usamos todos mil chapéus de bicos


mal recortados e de encontro ao sol

o nosso mais perfeito em franja e bico

e um arremedo tal e seicentista

que ofuscando-se: o sol

Usamos todos esta condição

de pó de vento, ou de rio sem pé:

único dom de fabricar o tempo

em raiz de palmeira

ou de cipreste




Ana Luísa Amaral, Lisboa - 1956

26/10/2009

Triste fim de "Policarpo"(s) !

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Agreste pernambucanoFoto: Pedro Moreira

O grande incoveniente da vida real e que a torna

insuportável para o homem superior é que,

se para ela são transportados os princípios do

ideal, as qualidades se tornam defeitos,

tanto que muito frequentemente aquele

homem superior realiza e consegue

bem menos do que aqueles movidos

pelo egoísmo e pela rotina vulgar.


"Triste fim de Policarpo Quaresma", de Afonso Henriques de Lima Barreto, escritor
nascido no Rio de Janeiro (1881-1922). De pena afiadíssima, criticava de forma clara e contundente a sociedade de seu tempo, não poupando políticos, famílias poderosas
e militares. Sua obra caracteriza-se pela temática social, com destaque para as camadas mais pobres, os boêmios e marginalizados. Desejava que sua literatura provocasse uma mudança nos costumes da sociedade, no sentido de acabar com os privilégios existentes apenas para alguns. Segundo ele, o escritor tinha uma função social a desempenhar. Entre suas obras podemos destacar:

Recordações do escrivão Isaías Caminha

O homem que sabia javanês e outros contos

Triste fim de Policarpo Quaresma

Os Bruzundangas

Outras histórias e contos argelinos

23/10/2009

Fome na Etiópia - Muito além da Arte e da ficcção!

"Chifre da África"




Decorridos vinte e cinco anos, quando 1 milhão de pessoas morreram de fome em decorrência da seca, a Etiópia faz um pedido de urgência para alimentar seis milhões e duzentas mil pessoas. Após 5 anos consecutivos de seca, a situação encontra-se dramática para os mais de 23 milhões de habitantes que constituem os 7 países da África Oriental, segundo relatos de organizações humanitárias.
A história da Etiópia é considerada uma das mais antigas do mundo, e de acordo com descobertas recentes, a espécie Homo Sapiens (da qual somos descentes), teria se originado dessa região. É o país mais populoso do Nordeste africano e cerca de 90% de seus habitantes vivem em zona rural. Os restantes ocupam as grandes cidades, como a capital Adis Abeba e Asmaru, além de outros centros comerciais como Dire Dawa, Dese, Harer e Gonder. É constituído de cristãos ortodoxos(influenciados pelo judaísmo) e muçulmanos.
Limita-se ao Norte pela Eritreia, a Leste pelo Dijibouti e pela Somália, ao Sul pelo Quênia e a Oeste pelo Sudão. Possui um dos mais baixos Índice de Desenvolvimento Humano(IDH) do mundo devido a graves problemas sociais.
O nome "Etiópia" é derivado do grego e significa "caras queimadas". Na Antiguidade, os europeus que falavam grego davam a denominação de "Etiópia" a todos os países constituídos de negros. Todas as terras abrangiam o "Chifre da África" (Somália, Etiópia, Dijibouti e Eritreia) e parte da Penísula Arábica.
Sua economia é predominantemente agrícola e encontra-se entre as mais atrasadas do mundo. Com secas periódicas, erosão e esgotamento do solo, alta densidade populacional, desmatamento e precárias condições de infra estrutura, torna-se difícil a sobrevivência do povo etíope. Metade da população (a terceira maior da África, ficando atrás apenas do Egito e da Nigéria) sofre de subnutrição.

17/10/2009

Urgentemente



É urgente o Amor!

É urgente um barco no mar

É urgente destruir certas palavras,

ódio, solidão e crueldade,

alguns lamentos,

muitas espadas.

É urgente inventar alegria,

multiplicar os beijos, as searas.

É urgente descobrir rosas e rios

e manhãs claras.


Cai o silêncio nos ombros,

e a luz impura até doer.

É urgente o Amor.

É urgente permanecer. (grifo meu)



Eugenio de Andrade, poeta português (1923-2005)

14/10/2009

Prometeu Acorrentando ou a busca do Conhecimento

Prometeu acorrentado, de Rubens

"Olimpo", de Giovanni Battista Tiepolo

O mito de Prometeu conta a história do despertar da humanidade. Por ser um "titã" (ancestral dos deuses olímpicos), uma transição entre o divino e o humano, simboliza a luta contra a subjugação ao poder supremo comandado por Zeus. Representa também o início do desenvolvimento do intelecto, do pensamento. Derivado de promethes, que significa previdente, aquele que pensa e prevê, Prometeu deu vida ao homem de barro por ele modelado, com a ajuda do fogo sagrado roubado, contra a vontade de Zeus. O fogo representava a inteligência e a sabedoria, diferenciando o homem dos animais. Zeus, que era o deus do Olimpo, pretendia manter a humanidade numa situação igual a dos animais. Prometeu porém, rouba uma parte do fogo divino, trazendo-o para os homens, que a partir de então passam a pensar. Zeus fica furioso e resolve então vingar-se, acorrentando Prometeu em uma montanha do Cáucaso, onde um abutre diariamente devorará o seu fígado, considerado o órgão mais importante do corpo humano, pois simbolizava a vida. Como o fígado é o único órgão do corpo que tem a capacidade de regenerar-se, Prometeu jamais morreria, sendo portanto , condenado ao suplício eterno.O mito de Prometeu Acorrentado nos indica o início da civilização a partir da descoberta do fogo pelo homem. Simboliza também a luta permanente da humanidade face aos desafios e sacrifícios para alcançar seus ideais.


Na Antiguidade, o mito de Prometeu foi mencionado em quatro obras: "Protágoras", de Platão, "Prometeu", de Ésquilo, "Teogonia" e "Os trabalhos e os dias", de Hesíodo.


Prometeu carregando o fogo - Jan Cossiers

11/10/2009

Vai-te, Poesia !

guerreiro karo, do sul da Etiópia (África)


Deixa-me ver a vida

exacta e intolerável

neste planeta feito

de carne humana a chorar


Onde um anjo me arrasta

todas as noites para casa

pelos cabelos

com bandeiras de lume nos olhos,

para fabricar sonhos

carregados de dinamite de lágrimas.


Vai-te, Poesia!


Não quero cantar.

Quero gritar!




José Gomes Ferreira, jornalista, escritor e poeta, nascido na cidade do Porto (Portugal) - 1900-1983

06/10/2009

"Estamos informados de tudo, mas não sabemos de nada"

A diversidade tecnológica quer significar diversidade democrática. A tecnologia põe a imagem, a palavra e a música ao alcance de todos, como nunca antes ocorrera na história humana, mas essa maravilha pode se transformar num logro para incautos
se o monopólio privado acabar impondo a ditadura da imagem única e da música única. Ressalvadas as exceções, que afortunadamente, existem e não são poucas, essa pluralidade tende, em regra, a nos oferecer milhares de possibilidades de escolher entre o mesmo e o mesmo. Como diz o jornalista argentino Ezequiel Fernandez-Moore, a propósito da informação: "Estamos informados de tudo, mas não sabemos de nada".

Voo e vertigem da tecnologia da comunicação, que parece bruxaria: à meia noite, um computador beija a testa de Bil Gates, que de manhã desperta transformado no homem mais rico do mundo. Já está no mercado o primeiro microfone incorporado ao computador, para que se converse com ele.
No ciberespaço, Cidade Celestial, celebra-se o matrimônio do computador com o telefone e a televisão, convidando-se a humanidade para o batismo de seus filhos assombrosos.

(...)

Encélado, uma das luas geladas de Saturno

Ao redor da Terra gira um anel de satélites cheios de milhões e milhões de palavras e imagens, que da Terra vêm e à Terra voltam. Prodigiosas engenhocas do tamanho de uma unha recebem, processam e emitem, na velocidade da luz, mensagens que há meio século exigiriam 30 toneladas de maquinaria. Milagres da tecnociência nestes tecnotempos: os mais afortunados membros da sociedade midiática podem desfrutar suas férias atendendo o telefone celular, recebendo e-mail, respondendo ao bipe, lendo faxes, transferindo chamadas do receptor automático, fazendo compras pelo computador e preenchendo o ócio com os videogames e o telefone portátil.

No século XVI, alguns teólogos da igreja católica legitimavam a conquista da América em nome do direito da comunicação: "Jus communications" - os conquistadores falavam, os índios escutavam. A guerra era inevitável justamente quando os índios se faziam de surdos. Seu direito de comunicação consistia no direito de obedecer. No final do século XX, aquela violação da América ainda se chama encontro de culturas, enquanto continua se chamando comunicação o monólogo do poder.

"Torre de Babel", de Pietr Bruegel
Trechos extraído do livro "De pernas pro ar", de Eduardo Galeano

04/10/2009

Mercedes Sosa - 1935-2009







Popularmente conhecida como "La negra" , por seus cabelos lisos e negros, Mercedes Sosa conquistou multidões de fãs em toda América Latina com sua voz grave e possante, sem jamais abrir mão de seu engajamento político, obrigando-a a exilar-se da Argentina durante a ditadura militar naquele país(1976-1983). Embora afastada dos palcos há alguns anos devido a problemas de saúde, conseguiu gravar um disco ("Cantora") com estrelas da música espanhola e latino-americana, como Joan Manuel Serrat, Luís Alberto Spinetta, Shakira e Caetano Veloso.
Nascida na província de Tucumán em 1935 (cidade onde foi celebrada a independência da Argentina, em 9 de julho de 1816), Mercedes cresceu em um bairro pobre, em meio à cultura popular, antes de tornar-se professora de dança folclórica, sempre vestida com seu tradicional poncho vermelho. Ao lado de seu marido, o músico Manuel Oscar Matus, com quem teve um filho, reorganizou o movimento "Novo Cancioneiro", resgatando o folclore e gravando seu primeiro disco: "Canciones con fundamiento". Em 1979, por ocasião de um concerto em La Plata, foi proibida de cantar, mesmo não estando impedida de permanecer em seu país. Ela prefere então instalar-se em Paris e posteriormente em Madri para que tenha a liberdade de cantar. Só retornará à Argentina em 1982, para uma série de concertos em Buenos Aires. A partir de então é convidada para apresentar-se nos lugares mais prestigiados do mundo, como a Capela Sixtina, no Vaticano, no Carnegie Hall de Nova York, no Coliseu, em Roma, por ocasião de um concerto pela paz, do qual participou Ray Charles.
Musicalmente foi uma cantora que desafiou temas ortodoxos, misturando o folclore ao rock, gravando com cantores de óperas. Deu grande contribuição à obra poética da chilena Violeta Parra, gravando inclusive uma de suas canções mais belas: "Gracias a la Vida".
Recebeu vários prêmios ao longo de sua carreira e, em 1992, ao ser condecorada "Cidadã honnoris de Buenos Aires", declarou:
" Estes prêmios me são concedidos não apenas porque canto, mas porque eu penso. Eu penso nos seres humanos e na injustiça. Creio que se não pensasse, meu destino não teria sido o mesmo"
Faleceu ontem, dia 3 de outubro, vítima de problemas hepáticos, aos 74 anos.

02/10/2009

El dia que me quieras


A Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) incluiu o tango da Argentina e do Uruguai como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, no último dia 30 de setembro, na cidade de Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos.
O tango tradicional é originário do vale do Rio da Prata, que banha os dois países, dançado pelas classes populares das cidade de Buenos Aires e Montevidéu.









Acaricia mi sueño

el suave murmullo

de tu suspirar...

Como rie la vida

si tus ojos negros

me quieren mirar

Y si es mio el amparo

de tu risa leve

que es como un cantar

ella aquieta mi herida

todo, todo se olvida...

El dia que me quieras

la rosa que engalana

se vestira de fiesta

con su mejor color

Y al viento las campanas

dirán que ya eres mia

Y locas las fontanas

se cantarán de amor


La noche que me quieras

desde el azul del cielo

las estrellas cellosas

nos mirarán pasar

y un rayo misterioso

hará nido en tu pelo

Luciérnaga curiosa

que verá que eres mi consuelo


Alfredo de Pera/Carlos Gardel