DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

01/03/2015

Rio, flor de janeiro!





 
A gente passa, a gente olha, a gente para e se extasia
Que aconteceu com esta cidade da noite para o dia?
O Rio de Janeiro virou flor nas praças,nos jardins dos edifícios,
no Parque do Flamengo nem se fala: é flor é flor é flor,
uma soberba flor por sobre todas, e a ela rendo meu tributo apaixonado.
Pergunto o nome, ninguém sabe.
 Quem responde é Baby Vignoli, é Léa Távora.
(Homem nenhum sabe nomes vegetais,
porém mulher se liga à natureza em raízes, semente, fruto e ninho.)
Iúca! Iúca, meu amor deste verão que melhor se chamara primavera.
Yucca gloriosa, mexicana dádiva aos canteiros cariocas.
Em toda parte a vejo.
 Em Botafogo, Tijuca, Centro, Ipanema, Paquetá,
a ostentar panículas de pérola, eretos lampadários, urnas santas, de majestade simples.
 Tão rainha, deixa-se florir no alto, coroando folhas pontiagudas e pungentes.
A gente olha, a gente estaca
e logo uma porção de nomes populares
brota da ignorância de nós todos.
Essa gorda baiana me sorri:
 – Círio de Nossa Senhora… (ou de Iemanjá?) –
 Vela de pureza, outra acrescenta. –
 Lanceta é que se chama. – Não, baioneta. –
 Baioneta espanhola, não sabia?
E a flor, que era anônima em sua glória, toda se entreflora de etiquetas.
Deixemo-la reinar. Sua presença é mel e pão de sonho para os olhos.
Não esqueçamos, gente, os flamboyants que em toda sua pompa se engalanam aqui,
 ali, no Rio flóreo. Nem a dourada acácia,
nem a mimosa nívea ou rósea espirradeira,
esse adágio lilás do manacá, esse luxo do ipê que nem-te-conto,
mais a vermelha aparição dos brincos-de-princesa nos jardins
onde a banida cor volta a imperar.
Isto é janeiro e é Rio de Janeiro janeiramente flor por todo lado.
Você já viu?
 Você já reparou?
 Andou mais devagar para curtir essa inefável fonte de prazer:
a forma organizada rigorosa esculpintura da natureza em festa,
 puro agrado da Terra para os homens e mulheres
que faz do mundo obra de arte total universal, para quem sabe (e é tão simples) ver?
 
( Carlos Drummond de Andrade ) 
  




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