(................)
Upa! Cá estamos. Custou-te, não, leitor amigo? É para que não acredites nas pessoas que vão ao Corcovado, e dizem que alí a impressão da altura é tal, que o homem fica sendo coisa nenhuma. Opinião pânica e falsa, falsa como Judas e outros diamantes. Não creias tu nisso, leitor amado. Nem Corcovados, nem Himalaias valem muita coisa ao pé da tua cabeça, que os mede. Cá estamos. Olha bem que é a cabeça do cônego. Temos à escolha um ou outro dos hemisférios cerebrais; mas vamos por este, que é onde nascem os substantivos. Os adjetivos nascem no da esquerda. Descoberta minha, que, ainda assim, não é a principal, mas a base dela, como se vai ver. Sim, meu senhor, os adjetivos nascem de um lado, e os substantivos de outro, e toda a sorte de vocábulos está assim dividida por motivo da diferença sexual...
- Sexual?
Sim, minha senhora, sexual. As palavras têm sexo. Estou acabando a minha grande memória psico-léxico-lógica, em que exponho e demonstro esta descoberta. Palavra tem sexo.
- Mas então, amam-se umas às outras?
Amam-se umas às outras. E casam-se. O casamento delas é o que chamamos estilo. Senhora minha, confesse que não entendeu nada.
- Confesso que não.
Pois entre aqui também na cabeça do cônego. Estão justamente a suspirar deste lado. Sabe quem é que suspira? É o substantivo de há pouco, o tal que o cônego escreveu no papel, quando suspendeu a pena.
Machado de Assis, em O cônego ou a metafísica do estilo - Várias Histórias - 1896.
Genial, genial, genial...o que dizer mais de Machado?
ResponderExcluirPoucos brasileiros sabem, mas Machado de Assis é estudado com afinco em muitas universidades estrangeiras, principalmente nos Estados Unidos.
Amiga, mais uma vez, parabéns!
Ótima semana e muitos beijos!!!
As palavras têm sexo. Bárbaro! Genial. Inspirador. Esse Machado era mesmo fogo :)
ResponderExcluirbeijoss