longamente
imperiosamente
De dentro deles teu amor me espera.
Teus olhos me olham numa tortura
de alma que quer ser corpo,
de criação que anseia ser criatura.
Tua mão contém a minha
de momento a momento;
é uma ave aflita
meu pensamento
na tua mão.
Nada me dizes,
porém entra-me a carne
a persuasão de que teus dedos
criam raízes
na minha mão.
Teu olhar abre os braços,
de longe,
à forma inquieta de meu ser,
abre os braços e enlaça-me toda a alma.
Tem teu mórbido olhar
penetrações supremas
e sinto, por sentí-lo, tal prazer,
há nos meus poros tal palpitação,
que me vem a ilusão
de que se vai abrir
todo o meu corpo
em poemas.
Gilka Machado, (1893-1980) escrevia poemas eróticos e sensuais desafiando a sociedade moralista e conservadora da época, despertando críticas ferrenhas até dos círculos intelectuais, notadamente dos modernistas, como Mário de Andrade, que chegou a chamá-la de "escandalosa" (!?). Apesar de ser polemizada tornou-se bastante popular e produziu uma extensa obra poética colocando a mulher numa posição ativa em meio ao universo machista da época. São dela Cristais Partidos (1915), Poesias (1915), Estados de Alma (1917), Meu glorioso pecado (1918), Mulher Nua (1922), entre outros.