O poeta lê seus versos para os cegos.
Não esperava que fosse tão difícil.
Sua voz fraqueja.
Suas mãos tremem.
Ele sente que cada frase
está submetida à prova da escuridão.
Ele tem que se virar sozinho,
sem cores e luzes.
Uma aventura perigosa
para as estrelas da poesia,
para as manhãs, o arco-íris, as nuvens, os neons, a lua,
para o peixe tão cintilante sob a água
e o falcão tão alto e quieto no céu.
Ele lê - pois já não pode parar-
sobre o menino de casaco amarelo num campo verde,
telhados vermelhos que se contam no vale,
números irrequietos na camisa dos jogadores
e a desconhecida, nua, na fresta da porta.
Ele gostaria de omitir - embora seja impossível -
todos os santos no teto da catedral,
a mão que acena do trem em partida,
a lente do microscópio, o anel e seu brilho,
as telas de cinema, os espelhos, os álbuns de
fotografia.
Mas é enorme a cortesia dos cegos,
admirável a sua compreensão, a sua grandeza.
Eles escutam, sorriem e aplaudem.
Um deles até se aproxima
com o livro de cabeça para baixo
pedindo um autógrafo invisível.
Wislawa Szymborska, Polônia (1923-2012)
Wislawa Szymborska, Polônia (1923-2012)
pior do que a cegueira é não querer ver...
ResponderExcluirbeijo
Tocante este poema. (susprio) Bonito.
ResponderExcluirUma escuridão angustiante que termina com a luz no fim do túnel.
Um beijo e bom inicio de semana!
Muito bom. Submeter-se à prova da escuridão é um grande desafio. Para todos, penso. Magnífico poeta.
ResponderExcluirBeijos,
GUAU! UNA OBRA MAGISTRAL. GRACIAS.
ResponderExcluirUN ABRAZO