Entre a agonia da página em branco ou da tela do computador, é sempre bom lembrar: “há uma gota de sangue em cada poema”, como dizia Mário de Andrade. Essa gota de sangue, na condição de metáfora, significa a urgência de não separar a arte da existência, o poema da vida e da convivência. Isso que não se aprende nos dicionários nem se apreende das gramáticas, retóricas e poéticas. Nosso desamparo fundamental. Nossa perplexidade diante e dentro da “máquina do mundo”.
Agonia em saber que gosto se discute. E que fazer poesia é talvez a mais fácil das artes. Agonia de suportar e transcender nossas ingenuidades, teimosias, vaidades e até mesmo desinformações. Agonia para enfrentar a necessidade de LER poemas: ler interpretando, ler discutindo e sobretudo reler nossos poetas fundamentais. Isto não é fácil.Como escrever poesia, poemas (e até mesmo “atentados poéticos”), ignorando inocentemente as obras (in)completas de Bandeira, Cardozo, Drummond, Cabral, Jorge de Lima, Murilo Mendes, Mário e Oswald de Andrade, Sousândrade, Gregório de Matos e Guerra...? E os nossos contemporâneos?
Essa agonia – rima pobre e rica com poesia – é nossa guerra particularíssima contra a hipocrisia de nossa preguiça mental, pedante, provinciana, tão eterna quanto efêmera. Que seja nosso desafio . Desejar saber que POESIA (em maiúscula ou não) é um trabalho permanente com a linguagem; que as palavras são palavrAÇÕES; que as inspirações são válidas quando passam pelo crivo das transpirações e transfigurações estéticas; que o aparentemente fácil pode ser o mais difícil, sem temer as incompreensões e até a má vontade dos leitores; que “lutar com palavras é a luta mais vã” (Drummond), sem temer a urgente necessidade da metacrítica, da metalinguagem e das potencialidades da alegria conjugando-se com a agonia de sempre.
Jomard Muniz de Brito, Recife, 1937 - Poeta, escritor, cineasta, é autor de Inventário de um feudalismo cultural - Terceira aquarela do Brasil - Arrecife do desejo, entre outros..
Gostei, sobretudo, disso:".. a urgência de não separar a arte da existência, o poema da vida e da convivência". Eu imagino que, em todo Poeta há um anseio secreto em SER Poesia; ir além do FAZER. Talvez nem todos sintam, saibam, mas acredito nisso. Acho também sempre muito interessante, nesse mundo descartável, olhar as datas desses textos. O que é essencial fica e vale para sempre. Beijos, Ci!
ResponderExcluirGRACIAS POR COMPARTIR TAN INTERESANTE TEMA. MUY INSTRUCTIVO PARA MI. GRACIAS.
ResponderExcluirBESOS