A mãe, as professoras
e os dias de um escritor
O primeiro foi aquele em que sua mãe lhe mostrou um ABC, passando em seguida a dizer os nomes das letras. Jamais esqueceria o encantamento que o desenho delas lhe provocaram logo à primeira vista. Arrumadas em filas no abecedário, formavam um conjunto enigmático. Cada uma, porém, tinha sua própria identidade e personalidade, como as coisas e as pessoas. E eram elas que davam registro a tudo o que há na Terra e no céu, compreenderia depois, quando aquela senhora chamada Durvalice começou a juntá-las em sílabas - bê-a-bá, bê-e-bé... - e, nos dias seguintes, em vocábulos que passariam ao reino das frases, Ivo-viu-a-uva...
Aquele menino nunca tinha visto uma uva. Agora sabia que se tratava de uma fruta. Mas como é, mãe? Ela também não conhecia. Seu mundo era o das jabuticabas, murtas, graviolas, muricis, cajás, umbus.
Quando foi para a escola, num mês de março, já sabia ler a cartilha, o que deixara a professora Serafina muito feliz. Então chegou o dia 7 de setembro. Escolhido para recitar um poema patriótico em cima de um palanque, viu a praça antes empoeirada e deserta apinhar-se de gente. Pensou que ía cair, tal era a tremedeira nas pernas. Ainda assim, soltou a sua voz gasguita: "Auriverde pendão da minha terra/ que a brisa do Brasil beija e balança/ estandarte que a luz do sol encerra/ as divinas promessas de esperança"...
O público reagiu com lágrimas, num emocionado preito a uma criança capaz de memorizar todas aquelas palavras bonitas. Dalí por diante, se lhe perguntassem o que queria ser quando crescesse, já tinha a resposta: Castro Alves.
Aí chegou outra professora. "Leve os meninos", disse-lhe dona Serafina. Triste notícia. Que graça teria uma escola sem meninas? A recém-chegada chamava-se Teresa, que trazia uma novidade: um livro para ser lido em voz alta, tão encardido e probezinho quanto aquele lugar de lavradores. Vinha a ser uma antologia de contos, crônicas e poesias. Para começar, ao personagem dessa história coube um texto de José de Alencar, que nunca esqueceria: "Verdes mares bravios da minha terra natal, onde canta a jandaia na fronde da carnaúba". Imagine o efeito disso. Ele não fazia a menor ideia de como era o mar.
Também não tinha familiaridade com a chuva, o tema de uma redação, dificílimo, para quem vivia no polígono das secas. Asas à imaginação. Seu desempenho na escrita ganhou fama, levando-o a ser solicitado à realização de serviços mais desafiadores, por exemplo, as cartas dos apaixonados do lugar - e suas respostas. E as das chorosas mulheres dos migrantes. Essas eram de cortar o coração.
E assim iria se fazendo um escritor nascido na roça. As leituras o levaram a trocar a enxada pela caneta, com a qual vivia a cavar o seu sustento pela vida afora. E sempre a olhar as letras com o mesmo encanto com que as viu pela primeira vez.
Crônica de Antonio Torres
Olá, caríssima!
ResponderExcluirUma pergunta:
E esse livro já em 107 edições, continua a ser lido?
Por vezes fazem-se modernices que não prestam e esquece-se o que havia de bom.
* Quanto ao meu livro:
O único disponível aí, no Brasil, é
"Por detrás das Palavras".
Para informações ou aquisição
(011) 50212233 Marcio ou Maria
ou
Maria@becodospoetas.com.br
Claro que tenho cá ainda o livro/catálogo
As Cores do Poema.
Mas é ao complicado para ambos (e caro!) enviar daqui livros...
que desisti!
Assim vai a "linda" política de Cooperação Cultural que nos dá os nossos governantes...
Obrigado pelo seu interesse.
Beijinhosss
Essa cartilha não é mais usada, mas foi a partir dela que quase tudo começou! Se ela ainda existe deve ser apenas como preciosidade de algumas bibliotecas!
ResponderExcluirObrigada pela dica do livro, vou procurar por aqui.
beijo
BUENO, COMO QUE LAS LETRAS JAMÁS TENDRÁN VIGENCIAS.
ResponderExcluirUN ABRAZO