DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

09/10/2014

O fascismo ronda o Brasil em 2014 - Frei Beto

Ao votar este ano, reflita se por acaso você estará plantando uma semente do fascismo ou colaborando para extirpá-la.


Jean-Marie le Pen, líder da direita francesa, sugeriu deter o surto demográfico na África e estancar o fluxo migratório de africanos rumo à Europa enviando, àquele sofrido continente, “o senhor Ebola”, uma referência diabólica ao vírus mais perigoso que a humanidade conhece. Le Pen fez um convite ao extermínio.
O ex-presidente francês Nicolas Sarkozy propôs a suspensão do Tratado de Schengen, que defende a livre circulação de pessoas entre trinta países europeus. Já a livre circulação do capital não encontra barreiras no mundo… E nas eleições de 25 de maio a extrema-direita europeia aumentou o número de seus representantes no Parlamento Europeu.
A queda do Muro de Berlim soterrou as utopias libertárias. A esquerda europeia foi cooptada pelo neoliberalismo e, hoje, frente a crise que abate o Velho Mundo, não há nenhuma força política significativa capaz de apresentar uma saída ao capitalismo.
Aqui no Brasil nenhum partido considerado progressista aponta, hoje, um futuro alternativo a esse sistema que só aprofunda, neste pequeno planeta onde nos é dado desfrutar do milagre da vida, a desigualdade social e a exclusão. Caminha-se de novo para o fascismo?
 Luis Britto García, escritor venezuelano, frisa que uma das características marcantes do fascismo é a estreita cumplicidade entre o grande capital e o Estado. Este só deve intervir na economia, como apregoava Margareth Thatcher, quando se trata de favorecer os mais ricos. Aliás, como fazem Obama e o FMI desde 2008, ao se desencadear a crise financeira que condena ao desemprego, atualmente, 26 milhões de europeus, a maioria jovens.
O fascismo nega a luta de classes, mas atua como braço armado da elite. Prova disso foi o golpe militar de 1964 no Brasil. Sua tática consiste em aterrorizar a classe média e induzi-la a trocar a liberdade pela segurança, ansiosa por um “messias” (um exército, um Hitler, um ditador) capaz de salvá-la da ameaça. A classe média adora curtir a ilusão de que é candidata a integrar a elite embora, por enquanto, viaje na classe executiva. Porém, acredita que, em breve, passará à primeira classe… E repudia a possibilidade de viajar na classe econômica. Por isso, ela se sente sumamente incomodada ao ver os aeroportos repletos de pessoas das classes C e D, como ocorre hoje no Brasil, e não suporta esbarrar com o pessoal da periferia nos nobres corredores dos shopping-centers. Enfim, odeia se olhar no espelho…
O fascismo é racista. Hitler odiava judeus, comunistas e homossexuais, e defendia a superioridade da “raça ariana”. Mussolini massacrou líbios e abissínios (etíopes), e planejou sacrificar meio milhão de eslavos “bárbaros e inferiores” em favor de cinquenta mil italianos “superiores”… O fascismo se apresenta como progressista. Mussolini, que chegou a trabalhar com Gramsci, se dizia socialista, e o partido de Hitler se chamava Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, mais conhecido como Partido Nazista (de Nationalsozialist). Os fascistas se apropriam de símbolos libertários, como a cruz gamada que, no Oriente, representa a vida e a boa fortuna. No Brasil, militares e adeptos da quartelada de 1964 a denominavam “Revolução”. O fascismo é religioso. Mussolini teve suas tropas abençoadas pelo papa quando enviadas à Segunda Guerra. Pio XII nunca denunciou os crimes de Hitler. Franco, na Espanha, e Pinochet, no Chile, mereceram bênçãos especiais da Igreja Católica. O fascismo é misógino. O líder fascista jamais aparece ao lado de sua mulher. Como dizia Hitler, às mulheres fica reservado a tríade Kirche, Kuche e Kinder (igreja, cozinha e criança). O fascismo é anti-intelectual. Odeia a cultura. “Quando ouço falar de cultura, saco a pistola”, dizia Goering, braço direito de Hitler. Quase todas as vanguardas culturais do século XX foram progressistas: expressionismo, dadaísmo, surrealismo, construtivismo, cubismo, existencialismo. Os fascistas as consideravam “arte degenerada”. O fascismo não cria, recicla. Só se fixa no passado, um passado imaginário, idílico, como as “viúvas” da ditadura do Brasil, que se queixam das manifestações e greves, e exalam nostalgia pelo tempo dos militares, quando “havia ordem e progresso”. Sim, havia a paz dos cemitérios… assegurada pela férrea censura, que impedia a opinião pública de saber o que de fato ocorria no país. O fascismo é necrófilo. Assassinou Vladimir Herzog e frei Tito de Alencar Lima; encarcerou Gramsci e madre Maurina Borges; repudiou Picasso e os teatros Arena e Oficina; fuzilou García Lorca, Victor Jara, Marighella e Lamarca; e fez desaparecer Walter Benjamin e Tenório Júnior.
Ao votar este ano, reflita se por acaso você estará plantando uma semente do fascismo ou colaborando para extirpá-la.

4 comentários:

  1. Estoy totalmente de acuerdo con todo lo que cuentas. España ha sido el único país de Europa en las elecciones europeas en el que ha aumentado los votos de izquierda, y apenas tenemos extrema derecha, porque la derecha que nos gobierna ya es bastante extrema.

    Como dijo el gran magnate Warren Buffet "Claro que hay una lucha de clases, y es mi clase, la de los ricos, que va ganando"

    Pero no hay mayor estupidez que un pobre o una persona de clase trabajadora le de su voto a la derecha, y mucho menos a la derecha más fascista.

    Ojalá estemos a tiempo de darle una vuelta al mundo.

    Ah, ha sido una maravilla leer los versos de Lorca en portugués, gracias.

    Un beso,

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  2. Também aqui vivemos o fascismo e penso que ninguém o quer de volta. Espero que o Brasil tenha votado com consciência e que venham as mudanças tão necessárias, principalmente na saúde e educação. Um beijinho, amiga e um bom fim de semana
    Emília

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  3. Meu voto foi e continuará sendo nulo. Mas a reflexão nos remete a nós, sim.

    Beijos, Ci

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  4. Oi Ci!

    Realmente, vivemos num tempo muito estranho... seu texto foi cirúrgico! O que vejo claramente é que a maioria dos brasileiros é indecentemente manipulada pela mídia, que enfia goela abaixo as novas tendências da moda, as músicas descerebradas do momento, os costumes futilizados a serem seguidos e os heróis ocos a serem exaltados. Parece claramente um programa muito bem estruturado para manter a ignorância disfarçada de "seguidores das novas tendencias". E, naturalmente, as grandes metrópoles são as que mais aderem às estas modas.

    Nessas épocas políticas, vemos muitos superficialmente preocupados com o futuro do país, baseados em informações superficiais do que acontece no Brasil, através de uma imagem permeada de clichês. As manifestações de 2013 foram também superficiais, porque infelizmente a grande maioria é politizada superficialmente. Enfim, aqueles que a grande mídia pinta como os salvadores da pátria, eu costumo a tratar como os "entregadores da pátria".

    Já me alonguei demais... ótimo o seu post!!

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