DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

07/09/2011

As multidões


Não é dado a todo o mundo tomar um banho de multidão: gozar da presença das massas populares é uma arte. E somente aquele pode fazer, às expensas do gênero humano, uma festa de vitalidade, a quem uma fada insuflou em seu berço o gosto da fantasia e da máscara, o ódio ao domicílio e a paxão por viagens.
Multidão, solidão: termos iguais e conversíveis pelo poeta ativo e fecundo. Quem não sabe povoar sua saolidão também não sabe estar só no meio de uma multidão ocupadíssima.
O poeta gosta desse incomparável privilégio que é o de ser ele mesmo e um outro. Como essas almas errantes que procuram um corpo, ele emtra, quando quer, no personagem de qualquer um. Só para ele tudo está vago; e se certos lugares lhe parecem fechados é que, a seu ver, não valem a pena ser visitados.
O passeador solitário e pensativo goza de uma singular embriaguez desta comunhão universal. Aquele que desposa a massa conhece os prazeres febris dos quais serão eternamente privados o egoísta, fechado como um cofre, e o preguiçoso, ensimesmado como um molusco. Ele adota como suas todas as profissões, todas as alegrias, todas as misérias que as circuntâncias lhe apresentem.
Isto que os homens denominam amor é bem pequeno, bem restrito, bem frágil comparado a esta inefável orgia, a esta solta prostituição da alma que se dá inteiramente, poesia e caridade, ao imprevisto que se apresenta, ao desconhecido que passa.
É bom ensinar, âs vezes, aos felizes deste mundo, pelo menos para humilhar um instante o seu orgulho, que existem bondades superiores âs deles, maiores e mais refinadas. Os fundadores de colônias, os pastores de povos, os sacerdotes missionários exilados no fim do mundo conhecem, sem dúvida, alguma coisa dessas misteriosas bebedeiras; e, no seio da vasta família que seu gênio criou, eles devem rir, algumas vezes, dos que se queixam de suas fortunas tão agitadas e de suas vidas tão castas.

Pequenos poemas em prosa - Charles Baudelaire, Paris (1821-1867)

8 comentários:

  1. Adorei o blog! Passarei sempre para saborear mais literatura.
    Abraço,
    Marcela.

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  2. MUY REFLEXIVO TODO EL TEXTO.
    UN ABRAZO

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  3. Ci,
    Um texto bem interessante - não conhecia - que merece uma releitura.

    Beijo :)

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  4. Marcela, que bom que gostaste daqui, obrigada. Espero que voltes mesmo, terei o maior prazer em recebêla!

    bjs

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  5. Te gusta, Reltih? Estoy preocupada
    porque el Google translate está con problemas. Está dificil para traducir el português?

    un abrazo

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  6. AC, esse "Pequenos poemas em prosa"
    contém uns textos poéticos muito bons; Baudelaire, ah Baudelaire!!!

    beijos :)

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  7. Vou reler também. Não consegui construir uma impressão. A princípio, a palavra multidão me assusta.
    Beijosss

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  8. É que a multidão é como a impulsividade, e como tal, abriga sentimentos imprevisíveis, é como uma boiada solta num campo aberto!
    E às vezes nos sentimos extremamente sozinhos e inseguros
    no meio dela :)

    beijoss

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