DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

11/06/2013

O quotidiano "não"




 
Estamos todos bem servidos
de solidão.
De manhã a recolhemos
do saco, em lugar de pão.
 
Pão é claro que temos
(não sou exageradão)
mas esta imagem do saco
contendo um pequeno "não"
 
não figura nesta prosa
assim do pé para a mão,
pois o saco utilizado,
que pode ser o do pão,
 
recebe modestamente
a corriqueira fracção
desse alimento que é
tão distribuído, tão
 
a domicílio como
o leite ou o pão.
Mas esse leitor aí
(bem real!) já diz que não
 
que nunca viu no tal saco
o tal "não".
Ao que o poeta responde,
sem maior desilusão:
 
Para dizer a verdade,
eu também não...
Mas estava confiante
na sua imaginação
 
(ou na minha...)e que sentia
como eu, a solidão
e quanto ela é objecto
da carinhosa atenção,
 
de quem hoje nos fornece
o quotidiano "não",
por todos os meios, desde
a fingida distracção
até ao entre-parênteses
de qualquer reclusão
 
 
Alexandre O'Neill, Lisboa (1924-1986)

 



2 comentários:

  1. O'Neill é especial!!!
    Obrigado pela sua visita a Cores & Palavras.

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  2. Estás nos apresentando, O'Neill e eu. Sempre que me apresentas um poeta, corro em busca de mais sobre ele, é o que farei agora, depois de ler o poema. Obrigada, Ci!

    Beijos,

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