DE CHARLES BUKOWSKI (1920-1994)

Arder na água, afogar-se no fogo. O mais importante é saber atravessar o fogo.

05/02/2014

Deborah Brennand




O Javali
 
O sol caiu no açude
igual a um javali eriça pelos de luz.
                      Vai às águas fundas.
Depois flutua em juncos.
O seu dourado focinho.
As nuvens não ligam,
ficam longe, arredias,
                      as folhas se amoitam em sombras infiéis.
Alguém diz: - Está ali a presa, atira,
suja o juncal de sangue,
no amanhã escuro dos beirais do charco
surgirá a caça morta.
                      - Nunca, é só engano. O sol não dorme.
Cai outra vez no açude.
Vai em águas fundas
e novamente flutua eriçado de luz.



Hoje tive o prazer de conhecer a poesia de Deborah  Brennand, essa poeta nascida no município de Nazaré da Mata(PE) e que durante muito tempo relutou em publicar seu tesouro. Após os apelos insistentes de seu marido, o artista plástico pernambucano Francisco Brennand, Ariano Suassuna  e do poeta César Leal, acabou cedendo. Ainda bem!!
 

 

CRUEL MENSAGEM
 
Morto foi o sonho de um jardim
Por um verão servil, de cruel mensagem
E eu vi raízes, a vida agonizando,
Na lâmina acesa de um punhal.
Os musgos, as heras, as papoulas,
Manchavam a grama seca.
E lírios, junto ao sangue das rosas,
Magoados eram o pasto
De cavalos alheios e famintos.
 
 
IGUAL A MÃO
 
Velhas cortinas de renda
Por sonhos bordando brasões
Agulhas trançaram ouro e linha
 Em sombras fugazes de flores
 Fantasmas de um morto verão.
Cobrindo vidraças, embaçando a vida,
Escondes desvarios, alucinações,
Olhares perdidos de condessas
 Caminhos ocultos na distância
 E o vento forte, agitando o pano
Com a rudeza de sua mão.
 
 
SEMPRE
 
  Assim, além da cerca, eu espero,
O quê? Não sei. Espero.
Embora só o vento chegue todo arranhado,
 em gemidos, caindo e já sem sentidos
Jogue aos meus pés as folhas secas.
 
 
DE AMARELO
 
  Hoje devo me vestir de amarelo:
espantar os olhos negros da solidão,
tal a luz do girassol de ouro dourado
que abre pétalas iluminando nuvens.
Quem saberá (nem ela mesma) o artifício usado para enganá-la?
 Sonhos? Jardins? Não digo.
 Hoje me visto de amarelo e vou,
 nos ramos, entoar da ave o canto.
Quero espantar olhos de solidão
que vem das grutas e abandona montes
para comer a relva rubra do meu coração.
Mas hoje, de amarelo, espantarei a fera
Fugindo, à procura de outra vítima:
Quem sabe, a mata?

2 comentários:

  1. UNA POETA MUY BRILLANTE. GRACIAS POR COMPARTIR.
    UN ABRAZO

    ResponderExcluir
  2. Quando um poeta desiste de guardar seus tesouros só pra si, acho que o mundo se ilumina um pouco mais! Muito boa, ela...

    Beijos, Ci!

    ResponderExcluir